Sabemos que a influência portuguesa sobre o Brasil remonta desde os tempos de Descobrimento e Expansão Marítima, quando certos ideais europeus já foram se difundindo de alguma forma, para os quatro cantos do mundo. Entretanto, acentuemos aqui a influência cultural portuguesa com maior impacto, aquando da instalação da família real em solo tropical, a partir do século XIX. Não discutamos as razões políticas desta transferência para evitarmos um distanciamento da linha de raciocínio. Ressaltemos, notoriamente, que a atitude real portuguesa marcou inegavelmente a situação cultural da colónia, na época. Diga-se que a multidão envolvida neste processo de transferência girou em torno de 10 mil pessoas entre a família real, a Corte e a aristocracia. A Inglaterra enviou uma esquadra de 13 embarcações para acompanhar toda a viagem. Obviamente, que a decisão do príncipe regente D. João, incluiu na longa jornada todo o tesouro português e sua estrutura burocrática de ministros, conselheiros, juizes da Corte Suprema, funcionários do Tesouro, patentes do Exército e da Marinha, membros do alto Clero, isto é, um grande arsenal científico, técnico e político. Neste ponto, o que nos interessa é destacar a ida, seja de forma precária ou não, de obras de arte, objectos dos museus e da Biblioteca Real, por volta de 60 mil livros. Decerto, estariam emigrando para o Brasil, uma parcela importante da intelectualidade ibérica, que aportaria em Salvador, em 22 de janeiro de 1808, após 54 dias de viagem.
Logo a família real se transferiria para o Rio de Janeiro, que foi sendo modificada pela nova administração estrangeira, para se fazer nos moldes europeus. A infra-estrutura da cidade foi sendo trabalhada e fomentada muitas vezes pelos ricos moradores, em troca de benefícios materiais ou atribuição de titulações de nobreza pelo príncipe regente (1). Uma multidão de imigrantes começou a aportar no Rio de Janeiro, com a perspectiva de construir uma vida melhor. Eram estrangeiros das mais variadas nacionalidades entre espanhóis, franceses, ingleses, alemães e suíços. Diante das distintas qualificações dos imigrantes, entre os quais citamos médicos, professores, alfaiates, farmacêuticos, modistas, cozinheiros e padeiros, ressaltamos a presença intelectual de representantes diplomáticos na nova capital do Império. Assim, a opinião pública da colónia, Rio de Janeiro, se enriqueceu devido ao teor de sua plural sociedade em crescimento.
Reuniões elegantes eram promovidas pela nobreza e esses bailes são indicativos de uma cultura musical começando a ser desenvolvida numa troca mútua de experiências entre os músicos dos salões e os músicos dos recantos mais populares. A sociedade feminina começa a quebrar a reclusão a que era submetida e passa a frequentar mais os espaços públicos, os teatros, além de se dedicarem à leitura. O príncipe regente incentivou a educação, através de uma iniciação escolar de primeiras letras. É claro que houveram problemas sociais variados como a questão da escravidão e a pobreza, porém não vem ao caso enveredarmos por estas discussões. Na sequência da dinâmica social, vale indicar o nascente desejo de estabelecimento de uma cultura geral nacional, a erguer o sentimento de uma futura e mais forte opinião pública neste sentido, até culminar no tingimento positivista da ordem e progresso na bandeira daquela nação. A ida da família real portuguesa para o Brasil, representou um evento impulsionador para aquele jovem país, injectando em seu solo, novos e riquíssimos ingredientes das mais variadas sociedades, que se confrontavam, seja de forma passiva ou não, modelando e construindo uma possibilidade nova de sociedade.
João Araújo é aluno do curso de
Mestrado em Criações Literárias Contemporâneas
Évora, Portugal
Página: http://www.jpoeta.blogspot.com/
1) Por exemplo, foram construídos chafarizes para o abastecimento de água, pontes e calçadas; abriram-se ruas e estradas; foi instalada a iluminação pública; passaram a ser fiscalizados os mercados e matadouros; organizadas as festas públicas, etc.