terça-feira, julho 31, 2007

Folia - Quinta da Reboleira - Sintra


a Fundação Cultursintra

apresenta:

Folia!

Mistério de uma noite de Pentecostes

Texto: Paulo Borges

Encenação: Rui Mário

Pelo Teatro TapaFuros


Quinta da Regaleira - Sintra

Até 8 de Setembro

5ª a Sáb.: 22h || Dom.: 20h

«A noite abre-se em luz. Nocturno cantado em voz de árvore, de atento mocho. Vozes muitas que anseiam paz. Vozes do mundo, no mundo... Folia nos ilumina, folia nos inflama! Flama de cor a romper solidão, a romper surdos gritos. Dos caminhos da Terra surgem homens e mulheres que sentiram uma voz que chama, em chama. Arde-lhes no peito. É o tempo? Os portões abrem-se, a mansão tem muitas portas, luz habita os salões e ri do serão... Esta a luz que vestirão. Homens e mulheres da Terra, convidados para a festa da Luz, convidados em mistério.» Rui Mário

«Folia ! propõe a recriação em termos contemporâneos da experiência da iniciação e da festa comunitária, associada a uma viagem pelo imaginário mítico, histórico e cultural português. (...) Folia ! – que se assume como corolário, mas não conclusão, das Comemorações do Centenário do Nascimento de Agostinho da Silva – propõe que as noites de verão na Quinta da Regaleira se tornem ainda mais feéricas e que possamos trazer esse espírito para as nossas vidas, celebrando-as como a quinta-essência deste Mistério de uma Noite de Pentecostes. » Paulo Borges

espectáculo ao ar livre de caracter volante

aconselha-se agasalho e calçado confortável

espectáculo aconselhado para maiores de 12 anos

Texto: Paulo Borges; Encenação/Direcção Artística: Rui Mário; Dramaturgia: Paulo Borges, Teatro TapaFuros; Direcção Musical/ Música Original: Pedro Hilário; Direcção de Actores: Samuel Saraiva; Interpretação: Carla Dias, Filipe de Araújo, João Vicente, Mário Trigo, Paulo Cintrão, Rute Lizardo, Samuel Saraiva, Vera Fontes; Músicos: Alexandre Leitão, António Neves, Jorge Domingues, Miguel Costa; Cenografia/Adereços/Video: Rui Zilhão; Coreografia: Mercedes Prieto; Desenho de Luz: José Miguel Antunes, Mário Trigo; Vozes Off: Elisabete Figueira, Jorge Telles de Menezes, Inês Figueira, Natasha Quaresma, Paulo Borges, Ricardo Ventura, Rui Lopo; Design / Web: Pedro Marques; Fotografia: Sérgio Santos; Figurinos: Elisabete Figueira, Pedro Marques; Costureiras: Ana Tobias, Doroteia Tobias; Luminotécnia: Fábio Ventura, Facas Valente, João Rafael, Laura Scheidecker; Apoio à Montagem: Emanuel Ventura, Gonçalo Africano; Direcção de Cena: Rui Mário, Sónia Tobias; Frente de Sala: Ana Rita Neves, Catarina Trindade, Catarina Salgueiro, Tânia Tobias; Produção Executiva: Sónia Tobias; Direcção de Produção: Marco Martin

Bilhetes: € 16 || à venda no local, Lojas Fnac, Bliss, Lojas Viagens ABREU, Livraria Bulhosa Oeiras Parque

www.ticketline.pt || www.plateia.pt

Reservas: 219 106 650 (informações) || 707 234 234

Apoios:

Contra o Abandono do Seu Melhor Amigo...




Palácio do Freixo, no Porto, recebe exposição de Salvador Dali



O Palácio do Freixo, no Porto, recebe, a partir de 1 de Agosto, 285 peças de Salvador Dali, entre desenhos, esculturas e quadros originais, anunciou hoje fonte da Câmara do Porto que organiza a mostra.

Estas peças, que são propriedade da Fondazione Metropolitana de Milão, Itália, estarão até 4 de Novembro no Palácio do Freixo, entre as 10:00 e as 22:00, e de sexta a domingo (incluindo feriados) das 10:00 às 24:00.

Esta exposição, promovida pela empresa municipal PortoLazer, inclui algumas das obras mais emblemáticas de Salvador Dali da Colecção Clot (obras originais certificadas).

Os ingressos para o público em geral custam quatro euros e dois euros para clientes da Caixa Geral de Depósitos, seniores (mais de 65 anos), sendo gratuitos para crianças até aos 12 anos.

Diário Digital / Lusa

Centro Cultural de Belém

PÉRICLES
1 e 2 de Agosto 2007
21h00 | Pequeno Auditório

Mais Informação
Hoje é o último dia para visitar a Nisartes. Aproveite!

Site

domingo, julho 29, 2007

Sozinho

Sento-me neste sofá já rasgado do tempo, repleto de marcas que formam encruzilhadas.

Deito-me no sofa, esperando o conforto do barulho que será emanado do ecrã...
Está vazio, nem um movimento...

Nem uma pálpebra se move neste imenso espaço,
Num movimento isolado, distraído do que me rodeia,
Repito-me e olho pela janela, de vidros baços e acompanhados de um frágil horizonte.

Essas linhas marcam a minha viagem.

São frias, curvas, interceptadas por um corte aqui e ali,
Deixam que as árvores as tornem tão inexpectáveis.
Que não me sinta vazio...

Talvez hoje não esteja tão sozinho...


Pietermaritburg
29/07/07

Reflexo

Acordo...
Acordo e olho a cortina escura que deixa o Sol entrar...

Penso que será mais um dia e que este será melhor.
O espaço que há entre nós não será assim tão grande que me impeça de te olhar.
Os lençois frios da noite, a tua cara já fria deste inverno...

Mais um suspiro e junta-se ao teu, ao que transpiras em cada poro.
Fecho os olhos, pensando que será uma boa altura para o fazer, e de novo acordo.

Já não te sinto ao meu lado,
Sei que não estás ao meu lado, sei que não exististe...

Sei que o teu rosto é a minha memória e a minha memória é o teu rosto.
E entre nós não há mais nada além de um leve reflexo do frio da noite.

O Sol não nasceu ainda...

Pietermaritzburg
29-07-07

sábado, julho 28, 2007

O Perfil do Indivíduo, do Público e do Artista do Século XIX (Parte I)

Antes da Idade Moderna, os artistas eram artesãos organizados em grémios que tinham a função de controlar o mercado de trabalho e responsabilizar-se pela formação dos seus membros. A sua clientela em geral era os príncipes, a nobreza, dignatários eclesiásticos e a rica burguesia, compradores de seus artesanatos. A partir do Renascimento, com a fundação cada vez mais crescente das academias, a rivalidade aumentou desvinculando o artista do status de artesão, evento este com o mesmo espírito do da criação das academias científicas da época, sob o apoio dos Estados. Assim, a obra de arte passou a ser um produto intelectual; seu valor artesanal ficou para trás e o artista deixou de ser um prático e passou a ser um sábio (1). A sensibilidade de alguns príncipes, possibilitava o patrocínio nas áreas da Escultura, da Pintura e da Arquitectura, colocando estas formas artísticas em patamares de interesse e incentivo próximos aos das Ciências, da Retórica e da Poesia. O ensino teórico nas artes foi organizado, exposições com as obras dos alunos eram preparadas e as academias, em sua maioria instituições estatais, actuavam também como associações de artistas. Tudo isso sob o apoio da nobreza cortesã, classe social esta que o tanto de demasiado restrita que era, também o era adinheirada. Os artistas mais afamados tornavam-se artistas cortesãos desfrutando de regalias económicas, profissionais e, de acordo com a sua desenvoltura, tinham uma liberdade de criação endossada pelo príncipe, o que fez das Cortes da Idade Moderna, lugares de emancipação artística. Citemos o exemplo do poeta Goethe que desde 1775 esteve a serviço do duque de Weimar, dando-lhe condições de existência tranquila e liberdade para se expressar artisticamente. O espírito da época dizia que mergulhar na contemplação artística levava a estados de sublimação e adoração capazes de libertar o ser das moléstias da vida. Enquanto a Igreja perdia terreno para a razão, a Arte ganhava importância e qualificações tais que ocupavam o posto de um tipo de segunda religião.
O espírito em que os homens do século XIX estavam embebidos, era o espírito denso da Revolução Francesa de 1789, que trouxe imensas novidades ao mundo através da sua ideologia libertária, dos direitos universais do homem e do cidadão, suas participações nos processos políticos e sua liberdade crítica com respeito à imposição da classe social e situação financeira da qual se originou. A estrutura do mecenato, onde o bom artista servia a um senhor poderoso e benevolente, foi criticada pelo espírito pós 1789, ainda que lhe prometesse uma suposta liberdade de criação. Mesmo com as interpretações do mecenato, como atitudes despóticas e abusos à liberdade de criação artística, os relatos de incentivos a vários artistas confirmam que esta prática continuou ocorrendo. E a resposta dos artistas beneficiados, é claro, era dedicar suas obras e suas composições musicais e literárias aos nobres.
Enquanto as Luzes do século XVIII haviam enxertado a intelectualidade nos homens, os movimentos reformadores do início do século XIX incitariam a liberdade económica de cada um. Um conflito ideológico social se erguia por todas as partes. Os homens que não tinham direitos como cidadãos tentavam indagá-lo e tê-lo. As distinções entre homens e mulheres começavam a ser postas em causa, as reuniões políticas deixaram de ser restritas e se tornaram assuntos comuns nas ruas, tabernas, praças, etc. Ser cidadão era participar em favor do bem comum, mas também em benefício do próprio interesse, no âmbito social e do grupo (2). Devido a esse sentimento libertário implantado em cada um, o indivíduo era dono de si e como tal, teria personalidade de escolher o melhor para si. Logo, o século XIX ficou marcado por um fluxo enorme de migrações, onde as pessoas procuravam, por si, liberdade de pensamento político e religioso. Tais movimentos migratórios ocorreram tanto entre os países da Europa, quanto na saída dos cidadãos para a América, onde as perspectivas de futuro melhores foram buscadas por milhões de alemães, polacos, italianos e irlandeses, por exemplo. Podemos citar essas movimentações no Brasil, na sequência da instalação da família real portuguesa.
O índice estatístico da população urbana aumentava cada vez mais, o que provocava nas cidades a necessidade de melhoramentos em suas condições gerais de transporte, iluminação e saneamento básico. Com a transfiguração e enriquecimento social dos espaços citadinos, do ponto de vista artístico e literário, era um convite às reflexões e produções locais, sobre as questões da modernidade subjacente. Os artistas adaptaram-se às ambivalências citadinas e as suas temáticas versavam tanto sobre o homem alienado com os efeitos da urbanização, quanto a possibilidade de libertação proporcionada por esta urbanização. Por um lado, o artista respondia com contrapropostas de melhoria do mundo, concebendo a arte como uma forma de mudança (3). Por outro, o artista converteu-se num individualista, criando objectos de produção e apropriação individual e expressando a modernidade nascente. Suas obras, reflectindo sobre as condições antropológicas mais elementares, deram aos artistas um status importante num século de avanço tecnológico proeminente. Em sua dupla face artística, o indivíduo moderno que era criativo, dinâmico, inovador, livre de amarras, urbano, mercantilizado e masculino, isto é, com umas tantas qualidades racionalistas do pensamento do século XIX, podia ser também encantador, onde a magia das suas obras elevaria o público a estados de veneração religiosa.
Entretanto, esse artista do século XIX enfrentou um público diferente. Segundo Richard Wagner (4), enquanto o artista era um mortal agraciado com o fogo da inspiração divina, cuja fé em si próprio movia seu génio bem-aventurado e rico, a grande massa pública heterogénea com que ele se deparava era formada de pessoas insensíveis, vazias, tirânicas e incapazes de compreender o verdadeiro valor de sua obra. O gosto artístico dos reis, que foram mecenas dos artistas, havia deixado de influenciar o gosto do seu público. Desde finais do século XVIII, a burguesia seguia seus próprios interesses e atenções aos artistas e suas obras, deixando de seguir os olhares da Corte. Nessa virada das características de seu público, o artista descontente, por mais que transparecesse desprezar ou maldizer a nova clientela, sofria por ela e vivia nela, que era formada por uma massa inapreensível e que quando fugia dos alcances do artista, nada corria bem para ele. Tal relação era de dependência e ódio, com um público moderno formado por críticos musicais, cada vez mais profissionais, directores teatrais, elementos de orquestras e outros. O artista ainda tentava escolher o contacto com o indivíduo isolado, como um príncipe por exemplo que, por mais controvérsia fosse sua personalidade, seria uma situação mais fácil de se contornar do que com o colectivo. Por um lado a proliferação das cidades, consequentemente, dos artistas e a ausência da figura do mecenas; por outro, a possibilidade livre de criação, a sua reafirmação como um deus das obras de arte e a reconfiguração do seu público, numa massa tirana e crítica a enfrentá-lo.
João Araújo é aluno do curso de
Mestrado em Criações Literárias Contemporâneas
Évora, Portugal

1) El hombre del siglo XIX. Versión española de: José Luís Gil Aristu. Madrid: Alianza Editorial, p. 337.
2) Idem. Ibidem, p. 17.
3) Idem. Ibidem, p. 18.
4) Idem. Ibidem, pp. 335-336.

sexta-feira, julho 27, 2007

2ª Feira Todo o Terreno - TOMAR

MAIS INFORMAÇÕES = www.ttminjoelho.net

Prémio Internacional de Poesia Palavra Ibérica 2008

A Câmara Municipal de Vila Real de Santo António e o Ayuntamento de Punta Umbría instituem o “Prémio Internacional de Poesia Palavra Ibérica 2008”

Podem concorrer a este prémio, todos os escritores, nacionais e estrangeiros, desde que as obras a concurso sejam apresentadas em português ou espanhol.


Os originais em português serão dirigidos ao júri do “Prémio Internacional de Poesia Palavra Ibérica 2008”, e deverão ser entregues em mão na sede do Município de Vila Real de Santo António – Praça Marquês de Pombal – 8900 – 231 Vila Real de Santo António ou remetidos por correio registado, com aviso de recepção, para a mesma morada, até ao dia 31 de Outubro de 2007.


Os originais em espanhol deverão ser entregues na Casa de Cultura de Punta Umbría – Plaza de las Artes s/n – Punta Umbria – 21100 Huelva, España, podendo as respectivas disposições regulamentares ser consultadas em www.ayto-puntaumbria.es.


A participação no Prémio com originais em português implica o conhecimento do respectivo Programa de Concurso, que foi publicitado na imprensa e pode ser consultado em www.cm-vrsa.pt ou solicitado à Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, Núcleo de Gestão dos Espaços Culturais, pelo telefone 281 510 045/7 ou fax nº 281 510 049.


Cada concorrente poderá participar apenas com um original, com um mínimo de trinta páginas e um máximo de quarenta, apresentado em triplicado, em letra Times New Roman, corpo 12 e espaço duplo.


Os originais deverão ser encerrados em invólucro opaco, fechado e lacrado, devendo constar no rosto, o título da obra e o pseudónimo do autor. Os elementos de identificação do autor deverão ser encerrados num segundo invólucro opaco, fechado e lacrado, em cujo rosto deve ser escrito o pseudónimo do seu autor. Por sua vez, os invólucros referidos nos números anteriores são guardados num outro invólucro opaco, fechado e lacrado, dirigido ao júri do concurso “Prémio Internacional de Poesia Palavra Ibérica 2008”.


O valor do Prémio em cada uma das modalidades, português e espanhol, é de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros). As obras vencedoras serão editadas em livro, recebendo os autores cinquenta exemplares a título de direitos de autor.

O júri, constituído por três escritores de reconhecido prestígio, deliberá até 31 de Dezembro de 2007, em acta que conterá os fundamentos da sua decisão.


Enviado por: Fernando Esteves Pinto

quinta-feira, julho 26, 2007

Entrevista a Miguel Nogueira

O 1º Livro Publicado:O 2º Livro Publicado:
Entrevista:

É um imenso prazer poder contar com as suas palavras aqui no nosso Blogue. Esperamos que com estas questões os nossos leitores o possam vir a conhecer melhor e, quem sabe, para quem ainda não o leu, despertar o interesse para o seu trabalho literário.

sandra martins – Que idade tem? Qual é/ foi o seu percurso académico? Qual é a sua profissão?

M.N. Tenho 21 anos. Fiz a escola secundaria até ao 9º ano, mas depois apercebi-me que precisava de algo diferente, uma área diferente que o ensino regular não me podia oferecer, e sendo assim estou neste momento no meu 3º ano, prestes a completar um curso profissional de nível III de Audiovisuais. Dado que o meu sonho é seguir cinema, mais concretamente realização, pretendo continuar os estudos depois de completar o curso. São estas as minhas duas paixões: escrever e cinema. Apenas e só estudante.

s.m. Quando começou a escrever?

M.N. Comecei a escrever aos meus 15 anos, depois de uma típica desilusão amorosa à “teenager”. Primeiro poesia, e com o tempo fui alargando um pouco mais, chegando a escrever pequenos contos de fantasia, reflexões sobre a vida e a sociedade na qual nos inserimos. E agora com alguma experiência, por assim dizer, tento escrever o meu primeiro romance, e tento aliar a minha escrita a outras formas de arte.

s.m. Além dos livros que apresentamos hoje aqui no Cultura já publicou e/ ou publica, actualmente, noutros suportes? (Quais?)

M.N. Para já apenas podem encontrar o “Fragmentos de Ninguém” e o “Lua Morta”. Mas espero em breve poder me exprimir artisticamente de outras formas, tais como BD, e argumentos para curtas-metragens que eu próprio realizo e faço a sua edição/montagem. E procuro sempre não ter apenas só a palavra, mas sim algo mais.

s.m. Actualmente a Internet é uma importante ferramenta na divulgação de todo o tipo de arte. O que pensa deste mundo? Noto que não aderiu ao mundo dos blogues. Alguma razão em particular?

M.N. A Internet é uma poderosa ferramenta para alcançar muitos meios, através dela partilhamos informações, partilhamos histórias, conhecemos pessoas de qualquer canto do mundo. Além de que podemos fazer mil e umas coisas comodamente em casa, não sei se isso será bom ou não, mas que nos torna um pouco mais sedentários e mais dependentes das novas tecnologias, também é uma verdade. Não podemos criticar muito porque tudo tem os seus lados positivos e negativos. Não existe qualquer razão especial para não ter criado um blogue, acho que nunca me dei ao trabalho de criar um, talvez depois desta entrevista…

s.m. Com certeza já terá recebido boas críticas em relação ao seu trabalho literário. Principalmente porque já publicou duas obras. Como se sente perante as palavras dos seus leitores e críticos?

M.N. É sempre bom receber elogios, mas prefiro receber críticas construtivas. Ouvir muitos elogios, penso que faz com que me acomode, faz-me parecer que cheguei a um patamar onde posso relaxar, e não quero isso. Gosto de discutir, ouvir novas ideias, formas de melhorar, e isso que me move, que me faz sempre querer mais e melhor quando escrevo. Encontrar uma maneira de chegar a um público mais vasto.

s.m. Qual foi a sensação de ver o seu primeiro livro publicado? Trouxe mudanças na sua vida? E o segundo?

M.N. Para ser sincero fiquei muito mais entusiasmado com a publicação do meu segundo livro. Com o primeiro foi um pouco do género “ok consegui, agora tenho de fazer melhor”, fiquei contente como é óbvio, porque apesar de tudo para a Corpos ter apostado em mim e porque algum talento haveria de ter. Com o segundo, senti-me mais realizado, mais orgulhoso, envolvi-me mais no desenvolvimento e sua apresentação. E também por motivos pessoais e desenvolvimento artístico, sinto-me mais “preso” ao “Lua Morta”. Em termos de mudanças, é sempre bom irmos a uma livraria, ver um livro nosso na estante. Tudo continua igual, os mesmos objectivos, o mesmo Miguel.

s.m. Conte-nos que tal é a experiência dentro da barriga do monstro livreiro do nosso país.

M.N. É um pouco complicado, dado que as editoras normalmente apostam já em nomes conhecidos, nomes que podem trazer pelo menos algum lucro. Torna-se uma luta conseguir levar as palavras a pessoas que desejam ler, desejam algo novo e diferente. Penso que o grande problema é que Portugal e o seu atraso de mentalidades, vive ainda muito agarrado ao passado. Primeiro que algo mude e evolua é um longo caminho a percorrer. Então o “Português” complica sempre o que é tão fácil de fazer. Para novos talentos é muito difícil alcançar algum reconhecimento, porque simplesmente não se aposta, prefere-se sempre jogar pelo seguro das velhas glórias.

s.m. Como surgiram os títulos dos seus livros?

M.N. O título do primeiro livro “Fragmentos de Ninguém”, apareceu de forma simples, como foi o meu primeiro livro quis um título que ilustrasse cada poema nele inserido. Como eu sinto que cada leitor se pode identificar com pelo menos um ou dois poemas, quis um titulo que não agarrasse o livro apenas a mim, mas sim a todos que o lessem, ou seja, cada poema é um momento, uma pequena história resumida, são fragmentos de situações e pensamentos meus, mas também desejo que cada leitor sinta as minhas palavras e as possa tomar, como sendo deles. Assim nasceu “Fragmentos de Ninguém”, não são só meus, não são de ninguém, são de toda a gente que queira tomar como seus. O título “Lua Morta” é um pouco mais pessoal, e também reflecte o caminho que tomei para a minha escrita, que se tornou um pouco mais mórbida e gótica, mas mantendo sempre o corpo do livro anterior, mas mais negro.

s.m. Fale-nos um pouco de cada uma das suas obras.

M.N. Os dois livros são bastante similares, vario sempre os assuntos e o objecto poético. O primeiro foi um agrupamento de momentos e reflexões que passei para o papel desde os meus 15 anos, e escolhi aqueles que achei que me davam melhor a conhecer ao público. O segundo tornou-se mais pessoal e pude brincar um pouco mais, arrisquei um pouco mais enveredando por uma escrita mais negra e “decadente”, com toques do surreal e abstracto, e criticas sociais. Os dois mostram o meu “Eu”, os meus sentimentos e forma de pensar, são muito pessoais, mas não tive medo de os revelar já que tenho a certeza que muita gente sente o mesmo, e mesmo que não sinta o importante é que entenda, que passe a sentir algo.

s.m. Uma vez que já tem experiência posso perguntar: considera mais complexo - escrever poesia ou prosa?

M.N. Para mim nem uma nem outra, depende do que sinto, daquilo que pretendo transmitir. De como quero expor as minhas palavras, o resto sai naturalmente e no fim ou tenho uma poesia ou prosa. Não me preocupo muito com regras ou linhas a seguir, o importante é a palavra.

s.m. Teve formação académica em Escrita Criativa? O que pensa desta disciplina?

M.N. Não, nunca tive formação nessa área. Acho que é uma disciplina que pode ajudar bastante o escritor a desenvolver as suas técnicas e formas de contar as histórias que deseja. Acho que a Escrita Criativa ajuda a mexer com a imaginação, a criar, a desenvolver, pode nos ajudar a libertar para conceitos e tramas que pensávamos nunca sermos capazes de visionar e passar para o papel.

s.m. Em termos literários, acredita no termo "Inspiração", no termo "Transpiração" ou na sua simbiose?

M.N. Acredito na “Inspiração”, depois tudo surge naturalmente, a escrita flúi e lá vamos nós criar “pessoas”, “locais”, “sentimentos” etc… Quando um escritor escreve carrega dentro dele várias personalidades, e quando acaba torna-se quase que um nascimento, o escritor volta ao seu “Eu”. Mas antes disso surge a “Inspiração”, a ideia principal, aquele “Bang” que despoleta tudo o resto.

s.m. Sente necessidade de organizar o seu tempo para escrever?

M.N.Todos os dias arranjo tempo para escrever, ando sempre com uma caderno de rascunhos para todo o lado, não saio de casa sem ele, sabe-se lá quando é que a inspiração se vai esbarrar contra nós. Mas normalmente tenho quase um ritual, todos os dias durante a tarde, pelo menos duas horas, vou para um cafezinho calmo e fico lá com os meus livros e caderno, depois à noite na janela ou no quarto.

s.m. Como caracteriza o seu processo de escrita?

M.N. Para a poesia é algo natural, sinto a necessidade de escrever, e escrevo. E a poesia, para mim, é a escrita que consegue contar histórias com pequenas palavras e significar tanto. Em relação a tudo o resto que escrevo, baseio-me sempre em algo antigo, filmes, contos, um quadro, procuro algo, nem que seja uma palavra, uma frase que me faça pensar e de repente aquela frase que mexeu comigo, já parece uma árvore com várias ramificações. Depois vou tentando conjugar as várias ideias e supostas soluções. No final muitas das vezes não tem nada a ver com a ideia original, mas todo o caminho que a ideia percorreu até eu ter finalmente terminado, foi o que a tornou coesa e que me deu entusiasmo ao escrever.

s.m. Os seus livros foram editados pela Corpos Editores. Como foi o processo?

M.N. Foi simples, rápido e eficaz. Acho que a forma mais crua que consigo encontrar para descrever.

s.m. O que pensa das edições de autor?

M.N. São edições para amigos. Ganhamos algum reconhecimento, mas basicamente não passa disso. Todos os dias temos que batalhar para o nosso nome não desvanecer.

s.m. Qual é a sua opinião em relação ao mundo editorial?

M.N. Muita quantidade e pouca qualidade. Parece que anda tudo atrás de dinheiro fácil.

Também a verdade é que ninguém se preocupa, o que importa é ter lá o livrinho.

s.m. Acha que o público, em geral, é mais sensível à poesia ou ao romance? E qual será a razão?

M.N. O público está muito mais aberto a romances, também porque têm muita mais visibilidade, e em termos de marketing estão em clara vantagem. A poesia fica encostada a um canto, no qual poucos se aventuram. É o que a tradição manda, os grandes poetas estão todos mortos.

s.m. Miguel, já se aventurou no mundo dos concursos literários?

M.N. Para já ainda não. Quando tiver algo diferente para mostrar talvez arrisque.

s.m. Que autores lê frequentemente?

M.N. O meu autor favorito sem sombras de dúvidas é Stephen King, acho divinal o livro “Misery”, mas também considero todas as suas obras geniais. A psicologia, o enredo, a maneira como escreve e que nos faz “espumar” pela próxima página é algo soberbo. Mas também gosto bastante de Anne Rice, Nicholas Sparks, John Steinback, Ingmar Bergman, Eça de Queirós, Miguel Torga, Agatha Christie, Paul Auster, Sophia de Mello Breyner Andresen, Antero de Quental, Fernando Pessoa, Howard Phillips Lovecraft, Umberto Eco, Gabriel Garcia Marquez, entre muitos outros.

s.m. Qual foi, até hoje, o(s) livro(s) e/ ou autor(es) que mais o marcaram? Porquê?

M.N. Stephen King – Misery. Simplesmente apaixonei-me, foi o primeiro livro que li deste autor, e acabei por devorar cada página. A psicologia, a dor, as situações, a demência humana que ele descreveu, acabam por tocar no leitor.

s.m. Qual é, na sua opinião, o/a artista português(a) – das mais variadas vertentes artísticas - que merece, da sua parte, maior admiração pelo trabalho desenvolvido para a divulgação da Cultura Portuguesa?

M.N. É uma questão complicada, mas já que tenho de eleger alguém, será então José Saramago, por variados motivos mas o de grande peso é o Prémio Nobel. Apesar de as suas obras não serem exactamente do meu agrado.

s.m. O que nos reserva para um futuro próximo, em termos de criação literária?

M.N. Já tenho material para outro livro de poesia. Também estou a terminar de escrever o meu primeiro romance, e depois disso quero me concentrar na escrita de pequenos contos de fantasia. E entre a escrita, vou-me dividindo a criar BD com argumentos meus e também curtas-metragens.

s.m. Que conselho daria a quem sonha melhorar o seu processo de escrita e, por fim, publicar?

M.N. Primeiro de tudo, ler muito e muito e muito e muito…E inconscientemente vamos absorvendo o que se lemos, acabamos por utilizar técnicas e maneiras mais inteligentes de desenvolvimento, de forma a tornar a leitura mais agradável para o leitor. Mas claro que para tudo é necessário também talento, é preciso saber exprimir-se através das palavras. Publicar é que já se torna mais complicado, acho que tendo talento e com alguma perseverança acabamos sempre por alcançar o que desejamos.

s.m. Escolha, por favor, um excerto/poema da sua obra e transcreva-o para os leitores do Cultura poderem ter uma antevisão da sua escrita.

Louco Social

Entusiasticamente, corres e tropeças, gritas e berras, levantas-te e cais. Atravessas ruas sem medo, um carro passa, quase te desfaz em cacos. O condutor envia palavras insultuosas na tua direcção. Tu não ouves. És um louco social, sem parâmetros nem roupas. És livre e vergonhoso. Torturas cada pessoa da tua vida com teus pensamentos. Pintas os momentos do teu respirar de forma abstracta, e juntas surrealismo à tua casa.

Incendeias vidas, queimas verdades e extingues mentiras com um bafo gelado.

“ Um Louco Social!” – Chamam-te eles.

Mas tu és tu, és um ser certo na tua ideia, do que deve ser a eterna juventude do espírito. Um freguês que consome a morte, olha à sua volta e degenera os elementos.

“Um Louco Social!” – Chamam-te eles

Crias avenidas de liberdade na tua mente, onde entusiasticamente, corres e tropeças, gritas e berras, cais e não te levantas. Os teus joelhos sangram, arrastas os ossos pelo chão. Mas o que te dói mais são as lágrimas de sangue que choras, que te obrigam a chorar, por todos os muros que te erguem em forma de protesto.

“Um Louco Social!” – Chamam-te eles.

Vês o teu retrato quebrado pela idade. Já não corres nem tropeças, já não gritas e berras, agora cais e não te levantas. Um animal amestrado pelas palavras e imagens de hoje em dia.

“Olhem mais um de nós. Um animal feroz, sem dentes nem rugido.” – Dizem eles.

* Poema incluído no livro “Lua Morta”

s.m. Agradeço-lhe Miguel, em nome do Cultura, a sua disponibilidade e interesse pelo trabalho que este blogue tenta fazer a nível da divulgação artística e desejo-lhe muito sucesso nos seus projectos futuros.


quarta-feira, julho 25, 2007

Entrevista a Inês Leitão

Breve Biografia

Inês Leitão tem 26 anos, está a terminar o curso de Estudos Anglo-Americanos na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, trabalha, actualmente, numa instituição bancária e publicou, recentemente, o seu livro "Quarto Escuro".

Livro publicado pela LivrodoDia Editores (2007)

Blogue da Autora

Entrevista

sandra martins - Olá Inês. Em primeiro lugar quero dar-lhe os parabéns pelo blogue e pela publicação do seu livro “QuartoEscuro”. É um prazer imenso poder contar consigo aqui neste nosso cantinho. Esperamos que com estas questões os nossos leitores a possam vir a conhecer melhor e, quem sabe, para quem ainda não a leu, despertar o interesse para o seu trabalho literário.

s.m. Quando começou a escrever?

Escrevi num diário durante muitos anos…experimentei o jornal da escola que frequentei no 7º ano, ia escrevendo coisas para os amigos…sempre foi mais fácil para mim usar cartas, texto, para dizer às pessoas que gostava delas…essa era a minha primeira grande necessidade na escrita.

s.m. Actualmente a Internet é uma importante ferramenta na divulgação de todo o tipo de arte. O que pensa deste mundo? A criação do seu blogue com o título apelativo “bocadosdecarnepelasparedesdoquarto” foi anterior ou posterior ao desejo e publicação do seu livro?

O blogue foi a forma que encontrei de escrever. Ele começou a crescer a sério há dois anos, quando voltei de Moçambique. E fez sentido que crescesse porque houve evolução. A Internet é, e continuará a ser, uma poderosa ferramenta de divulgação: dá visibilidade a autores jovens e aumenta a procura e o interesse.

O blogue foi muito anterior ao livro. Sinceramente quando o Bocados foi criado, não havia a ideia do livro.


s.m. Como se sente perante as críticas dos seus leitores e críticos?

É muito fácil recebermos críticas quando não há nada em jogo. Tive muita sorte, tive o apoio e o incentivo de professores e colegas na faculdade, tive a sorte de lançar o livro no Correntes d´Escrita 2007. Existiram reacções profundamente particulares, estranhas até, de leitores que se aproximaram de mim pelo livro…porque de alguma forma o livro mexeu com eles.

s.m. Qual foi a sensação de ver o seu primeiro livro publicado? Trouxe mudanças na sua vida?

Eu tenho um livro publicado. Através do livro ganhei amigos-leitores. Essa foi a grande mudança.

s.m. Conte-nos que tal é a experiência dentro da barriga do monstro livreiro do nosso país.

Profundamente angustiante (lol)


s.m. Como surgiu o título do seu livro “QuartoEscuro”?

Foi difícil pensar num título para este livro. O Luís Cristóvão, o meu editor, ajudou-me a pensar. Decidimos “Quarto Escuro” porque fazia sentido. O livro em si, é de facto, um quarto muito escuro.


s.m. Fale-nos um pouco do seu livro, por favor.

É um livro particular, que fala de afectos, que faz pensar e que faz sentir. Um leitor disse-me que o fazia sentir frágil. Eu fiquei a pensar nisso muito tempo… Fazer alguém sentir, é uma coisa muito séria.

Quando falamos do “Quarto escuro”, estamos a falar de um livro pequeno, de leitura asfixiante, composto por micro narrativas.


s.m. Inês, considera mais complexo - escrever poesia ou prosa?

Eu sinto que o meu caminho é a prosa. Acho que ambos são caminhos muito pouco fáceis.


s.m. Teve formação académica em Escrita Criativa? O que pensa desta disciplina?

Não, não tive. Mas considero que seria interessante fazer um curso desse género…é bom conhecer e partilhar. E esses cursos têm habitualmente espaço para o conhecimento e para a partilha.


s.m. Em termos literários, acredita no termo "Inspiração", no termo "Transpiração" ou na sua simbiose?

Acredito profundamente na inspiração. Há coisas que se passam à minha volta que me fazem escrever. Sem elas, o bloqueio era profundo e não saberia dizer nada de novo.

E já sei distinguir perfeitamente um momento de inspiração: sei o que tenho a fazer quando o sinto.

s.m. Sente necessidade de organizar o seu tempo para escrever?

Sinceramente não tenho tempo para escrever. O bocadosdecarne ajuda-me a sentir que tenho de arranjar tempo, dê por onde der.


s.m. Como caracteriza o seu processo de escrita?

Como lhe disse. Nasce sempre por inspiração. E a minha inspiração surge das coisas mais estranhas que possa enfrentar ou reconhecer na rua, em casa, com as pessoas que me rodeiam. Vem sempre de algo ou de alguém. E depois a história toma rumo próprio na minha cabeça, as personagens crescem e o enredo nasce.

s.m. O seu livro foi editado pela LivrodoDia Editores. Como foi o processo?

Eu já conhecia o Luís Cristóvão da faculdade, ele era, e penso que ainda é, um leitor do blogue. Um dia ele disse-me que queria editar-me e eu gostei da ideia. (lol). Convidou-me a reunir alguns textos e a apresentar-lhos. Foi o que fiz, e em Fevereiro de 2007 o livro nasceu.

s.m. O que pensa das edições de autor?

Eu penso, e continuarei a pensar, que é fundamental o nome de uma editora.

s.m. Qual é a sua opinião em relação ao mundo editorial?

Poucos autores marginais publicados…devíamos ser mais. Deveríamos ser uma aposta constante.

s.m. Acha que o público, em geral, é mais sensível à poesia ou ao romance? E qual será a razão?

Penso que será mais sensível ao Romance…mas também vejo muita gente que precisa de poesia para respirar.

s.m. Já se aventurou no mundo dos concursos literários?

Sim. Concorri a um concurso de peças de teatro. E com muita pena não ganhei (lol)

Tenho 3 peças por editar: “Quem tramou António Lobo Antunes”, “A última história de Werther” e “Amor em estado Morto”. Trata-se de uma trilogia.

s.m. Que autores lê frequentemente?

António Lobo Antunes, Gonçalo M. Tavares, Henry Miller (um escritor que me é muito querido).

Sinto que me estou a apaixonar muito devagarinho por Lídia Jorge e por Ruben A.

s.m. Qual foi, até hoje, o(s) livro(s) e/ ou autor(es) que mais a marcaram? Porquê?

Muitos. Acho que o livro que mais me marcou foi o “Retrato de Dorian Gray” de Oscar Wilde; Milan Kundera “A insustentável leveza do ser” é também uma referência.

Sou viciada em Lobo Antunes desde os 19.

s.m. Qual é, na sua opinião, o/a artista português(a) – das mais variadas vertentes artísticas - que merece, da sua parte, maior admiração pelo trabalho desenvolvido para a divulgação da Cultura Portuguesa?

Eu acho que existem tantos…é injusto dar só um nome….

Mas Paula Rêgo, talvez. Escolho-a porque ela é o grande rosto da pintura portuguesa no estrangeiro, e é uma autora que transforma o grotesco, como eu nunca imaginei ser possível. Acho que ver uma pintura de Paula Rêgo, é ver cultura Portuguesa moderna no seu melhor.

s.m. Qual é a sua opinião em relação à forma como a Arte é vista no nosso país? E considera que o povo português demonstra um grande interesse pelas diversas formas artísticas nacionais e internacionais?

Acho que o sistema esquece a educação para a cultura. Aprende-se a gostar e a aprende-se a compreender. No ensino pré-escolar e primário não existe qualquer preocupação em explicar arte e mostrar arte às crianças. Indivíduos que não são expostos a movimentações culturais em criança, não o serão certamente em adultos. E isso é uma falhar gravíssima no nosso sistema. Espero que mude.

A nossa grande arma é a educação.

s.m. O que nos reserva para um futuro próximo, em termos de criação literária?

Gostava de publicar um conto infantil. Escrevi um conto quando vim de Moçambique, sobre a experiência que tive numa missão com crianças e adultos infectados com Sida na casa das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus. Foram possivelmente os meses mais completos e mais felizes que vivi. As ilustrações do conto estão quase prontas.

s.m. Que conselho daria a quem sonha melhorar o seu processo de escrita e, por fim, publicar?

Escrever muito, sempre, até se atingir um estilo único e uma forma própria.

É disso que se precisa.

s.m. Agradeço-lhe, Inês, em nome do Cultura, a disponibilidade e interesse pelo trabalho que este blogue tenta fazer a nível da divulgação artística e desejo-lhe muito sucesso.

quinta-feira, julho 19, 2007

Entrevista a Paulo César


Paulo César despertou para o mundo da escrita muito cedo, aos 13 ou 14 anos. Actualmente, tem 28, um livro de contos editado sob o título "Desencantamentos" e um livro de poesia a caminho. Vamos conhecê-lo um pouco mais...

O 1º Livro publicado (Livro de Contos):

Entrevista:

Caro Paulo, é um enorme prazer poder contar consigo aqui no nosso Blogue. Esperamos que com estas questões os nossos leitores o possam vir a conhecer melhor e, quem sabe, para quem ainda não o leu, despertar o interesse pelo seu trabalho literário.

sandra martins – Que idade tem? Qual é/ foi o seu percurso académico? Qual é a sua profissão?

Paulo César - Tenho 28 anos. Acho que o meu percurso académico foi normal, sem grandes dramas nem brilharetes. Licenciei-me; sou nutricionista de profissão.

s.m. Quando começou a escrever?

P.C. Comecei a escrever aos treze ou catorze anos, não sei bem. Uns pequenos textos, dispersos, sem forma definida mas importantes na altura em que os escrevi.

s.m. Além do livro que apresentamos hoje aqui no Cultura já publicou e/ ou publica, actualmente, noutros suportes? (Quais?)

P.C. Não, nunca publiquei em nenhum outro suporte. Com excepção de uma revista amadora feita e publicada entre amigos, que infelizmente se extinguiu devido à falta de tempo.

s.m. Actualmente a Internet é uma importante ferramenta na divulgação de todo o tipo de arte. O que pensa deste mundo? Noto que não aderiu ao mundo dos blogues. Alguma razão em particular?

P.C. Sem dúvida. O poder da internet é enorme na divulgação das várias actividades artísticas e não tenho nenhum tipo de preconceito em relação à utilização desses meios. Não aderi ao mundo dos blogues porque acho que não tenho nada a dizer. A minha escrita não é propriamente um processo com resultados diários que possam alimentar um blogue. Se os conteúdos não fossem os meus próprios escritos não seria capaz de manter um blogue a falar sobre a minha escrita. Acho que é difícil fazer um site sobre um livro. Um livro é o que lá está escrito e para além de um ou outro comentário ocasional ou de uma entrevista eventual não há grande necessidade de falar sobre ele. Claro que seria uma forma importante de promover um livro mas confesso que não tenho qualquer vocação comercial… Se tivesse um agente que me gerisse a carreira seria ele a tratar disso, como o não tenho não tenho vontade de enveredar por esse caminho.

s.m. Com certeza já terá recebido boas críticas em relação ao seu trabalho literário. Como se sente perante as palavras dos seus leitores e críticos?

P.C. Não recebi muitas críticas e as que recebi, por virem de amigos, são necessariamente favoráveis. Se recebesse outras, dos leitores que compraram o livro, não seriam com certeza tão simpáticas. Gostava de as poder receber. Mas não me queixo das que tenho; mesmo parciais não deixam de ser agradáveis.

s.m. Qual foi a sensação de ver o seu primeiro livro publicado? Trouxe mudanças na sua vida?

P.C. É estranho ver um livro meu na estante de uma livraria. Imaginava-o, mas não esperava que me sentisse assim, com uma estranheza, com uma sensação difícil de descrever, nem boa nem má. Não trouxe qualquer mudança na minha vida, pelo menos ao nível do que é visível. Na minha vida “íntima” fiquei com a sensação de ter arrumado aquilo, aqueles textos, uma parte da minha vida, com uma estrutura que fica. É como se tivesse deixado de ter responsabilidade sobre os textos. Já não preciso de não os perder, de os compilar, de os tentar editar. Estão arrumados!

s.m. Conte-nos que tal é a experiência dentro da barriga do monstro livreiro do nosso país.

P.C. É uma experiência muito neutra. Fiz o livro e consegui que fosse publicado. Não me sinto dentro de um monstro com que tenho de aprender a lidar ou no qual tenho de saber conquistar um espaço meu. Não me preocupo com isso.

s.m. Como surgiu o título do seu livro?

P.C. Não tenho jeito para títulos. Nasceu por necessidade. O livro tinha de ter um nome e este fez sentido, porque é uma palavra que assenta bem em muitos dos textos. Para além disso é uma palavra bonita de ver escrita, desencantamentos, tanto à mão como a computador. E como o livro tem dois textos intitulados Encantamentos não me pareceu totalmente despropositado.

s.m. Descreve-o como um Livro de Momentos. Fale-nos um pouco de “Desencantamentos”, por favor.

P.C. Chamo-lhe um livro de momentos porque os textos tratam de momentos. Deveria ser um livro de contos, mas os contos contam uma história. Este livro é parado. Conta momentos e algumas sensações que lhes estão associadas. Quase sem história. Destas sensações gosto sobretudo da sensação de abandono, de perda, do gélido constatar de que a felicidade pode não ser tão fácil de atingir ou de manter. São doze textos, divididos em três capítulos: Contos de Fadas, Histórias de Abandono e Poço de Silêncio. Quase todas as histórias são histórias de encantar e simultaneamente histórias de abandono. Não felizes, mas não necessariamente tristes.

s.m. Uma vez que já tem experiência posso perguntar: considera mais complexo - escrever poesia ou prosa?

P.C. Prosa. A poesia é livre por natureza. A prosa mesmo que não seja executada como publicável precisa de ser legível. É importante que eu perceba o que lá está escrito, mesmo que seja eu o meu único leitor. Não se pode ignorar um mínimo de estrutura. A poesia é livre e auto-suficiente.

s.m. Teve formação académica em Escrita Criativa? O que pensa desta disciplina?

P.C. Não. Acho que a aprendizagem de escrita criativa nos pode ajudar a ter as ferramentas importantes para um trabalho. Mas acho que a criatividade não se pode ensinar. Não sinto que faça sentido, a menos que se encare a actividade literária como um trabalho, aí sim. Trabalha-se melhor, com maior correcção, suponho e maior sucesso. Mas como algo pessoal, íntimo ou como forma de expressão artística não faz sentido. Acho que a arte se pode construir com as mais débeis das ferramentas. Incomoda-me a ideia de se poder ensinar a escrever com criatividade (é pelo menos isto que a expressão escrita criativa me sugere).

s.m. Em termos literários, acredita no termo "Inspiração", no termo "Transpiração" ou na sua simbiose?

P.C. Mais uma vez depende do que é a escrita para o escritor. Se é trabalho acredito que a Transpiração é um meio muito válido para chegar ao resultado final e que poderá mesmo compensar de forma admirável uma Inspiração difícil. Pessoalmente e uma vez que a escrita é para mim uma necessidade acredito na Inspiração. Como necessidade que é se implicasse Transpiração acho que deixaria de escrever.

s.m. Sente necessidade de organizar o seu tempo para escrever?

P.C. Não o sei fazer. Sou desorganizado por natureza e infelizmente trabalho muito na minha vida profissional. Organizar o meu tempo para escrever era capaz de ser uma boa ferramenta para mim, mas não sei organizar tempos. E acho (preconceito!) que se reservasse uma fatia do meu tempo para a escrita sentava-me à secretária e não sairia nada. Gostava de escrever muito mais, mas não consigo.

s.m. Como caracteriza o seu processo de escrita?

P.C. Uma necessidade. Uma vontade de escrever que pode aparecer em qualquer local e em qualquer momento que aprendi a refrear por óbvias razões profissionais. É um prazer por vezes doloroso. Uma actividade solitária. E implica sempre papel, muito papel e uma caneta de tinta permanente. Para piorar a minha eficiência de escrita não sei escrever directamente ao computador.

s.m. O seu livro foi editado pela Corpos Editores. Como foi o processo?

P.C. O processo foi muito simples. Conheci uma autora publicada pela Corpos. Adquiri o livro dela e senti curiosidade em visitar o site da editora. Encontrei por lá a informação de que era possível enviar os textos por email e que seria possível responderem em cerca de um mês. Achei piada à ideia, que seria interessante saber o que diriam. Assim fiz. Mandei o projecto inicial do livro, responderam a dizer-me que era pequeno demais, juntei então alguns textos e pronto, disseram-me que sim e aqui está o livro publicado.

s.m. O que pensa das edições de autor?

P.C. Acho que são uma forma de colocar à disposição dos leitores obras que poderiam de outra forma ficar para sempre na gaveta. Por isso ainda bem que existem. Mas exigem da parte do autor um pensamento virado para a parte comercial. Porque é sempre necessário perder tão pouco dinheiro quanto possível. É preciso que se esteja disposto a dedicar algum esforço a pensar nessa vertente.

s.m. Qual é a sua opinião em relação ao mundo editorial?

P.C. Parece-me um mundo um pouco cruel, que vive bastante de modas e em que nem sempre é dado o verdadeiro valor ao conteúdo do que se publica. Mas toda a vida é construída assim, não creio que o mundo editorial seja pior do que qualquer outro dos mundos que frequentamos ao longo da vida.

s.m. Acha que o público, em geral, é mais sensível à poesia ou ao romance? E qual será a razão?

P.C. Ao romance. É mais fácil de ler. Existe uma história o que é uma importante componente do entretenimento. É fácil o leitor ser levado por uma boa história ao ponto de devorar um livro de uma ponta à outra. Um livro de poesia é diferente. É preciso ler aos poucos, permitir pausas para se transpirar bem o que se acabou de ler. Para além disso tem aquela maçada das coisas pessoais, dos sentimentos que não estamos preparados para ler, porque neles podemos reconhecer os nossos – algo universalmente reconhecido como verdadeiro incómodo.

s.m. Paulo, já se aventurou no mundo dos concursos literários?

P.C. Sim, participei em um ou dois, sem sucesso nenhum.

s.m. Que autores lê frequentemente?

P.C. Vários, leio de tudo e releio o que me mais me agrada. Destaco António Lobo Antunes, José Saramago, Mia Couto, Al Berto, Raul Brandão e Mário de Sá-Carneiro.

s.m. Qual foi, até hoje, o(s) livro(s) e/ ou autor(es) que mais o marcaram? Porquê?

P.C. Alguns dos meus livros favoritos: O Medo – Al Berto; Drácula – Bram Stoker; Poemas Completos – Mário de Sá-Carneiro; Terra Sonâmbula – Mia Couto; Todos os Nomes – José Saramago. O livro que realmente mais me marcou foi A Morte do Palhaço e o Mistério da Árvore de Raul Brandão. Foi uma leitura violentíssima da minha adolescência que me pôs em contacto com uma forma de ver o mundo que me diz muito, com os pequenos dramas pessoais, com a mesquinhez e com a felicidade de possuir algo imaginário e onírico a que nos poderemos agarrar quando tudo o resto falhar, porque falhará certamente. Gosto dessa sensação de impotência perante a vida, de pequenez… Mas há outros livros do mesmo autor de que gosto particularmente: Húmus e O Avejão.

s.m. Qual é, na sua opinião, o/a artista português(a) – das mais variadas vertentes artísticas - que merece, da sua parte, maior admiração pelo trabalho desenvolvido para a divulgação da Cultura Portuguesa?

P.C. Creio que José Saramago pela dimensão da sua obra e do seu prémio. Pena é que para que tal aconteça alguns fiquem mais remetidos à sombra como o António Lobo Antunes ou que outros como Al Berto, Fernando Pessoa ou Vergílio Ferreira por já terem morrido não possam alcançar maior visibilidade.

s.m. Qual é a sua opinião em relação à forma como a Arte é vista no nosso país? E considera que o povo português demonstra um grande interesse pelas diversas formas artísticas nacionais e internacionais?

P.C. Creio que o povo português não se habituou ainda a conviver com a Arte. Mas felizmente o panorama começa a alterar-se. Existe hoje uma grande oferta cultural que está extremamente disponível a quem dela quiser usufruir. É um começo. Falta depois a educação que permitirá maior exigência na escolha mas que só poderá vir depois. Há muitos espectáculos. A qualidade de muitos deles é duvidosa. Mas acho que é bom que as pessoas se habituem a ver. Mesmo os maus espectáculos. Só com a habituação poderá vir a escolha consciente do que se quer mesmo ver.

s.m. O que nos reserva para um futuro próximo, em termos de criação literária?

P.C. Tenho um livro de poesia preparado que enviei para um daqueles concursos literários de que falei atrás. Não sei o que espero. Talvez coragem para o submeter à consideração de uma editora para publicação. Não sei. É complicado o processo de envio. Há uma espécie de inércia que me torna fisicamente dolorosa a acção de anexar ao texto de email o documento e de o enviar.

s.m. Que conselho daria a quem sonha melhorar o seu processo de escrita e, por fim, publicar?

P.C. Não sei se serei grande conselheiro mas acho que o importante é escrever. Quilómetros de linhas, resmas de papéis ou infindáveis documentos de texto (para os não conservadores). Escrever é o fundamental. E nos intervalos (necessários; escrever também cansa) ler, ler muito.

s.m. Escolha, por favor, um excerto da sua obra e transcreva-o para os leitores do Cultura poderem ter uma antevisão do seu livro.

P.C. São também as articulações que se deformam e as mãos que começam, há dias piores do que os outros, a atrapalhar mais do que a ajudar, é a casa que já não está tão limpa como antigamente, todas as salas fechadas com os móveis cobertos por lençóis, que é por causa do pó, só o quarto, a cozinha e a casa de banho estão abertas, para uma mulher só chegam perfeitamente, nem era preciso tanto, é a roupa preta a envelhecer, a ficar esbranquiçada pelo uso e pelas lavagens consecutivas, o cabelo branco que vai cheirando a ranço porque já não se atreve a lavar a cabeça, com medo das constipações, e se uma constipação se agrava nesta idade uma pneumonia é o cabo dos trabalhos, e o resto, os problemas de bexiga que lhe vão impregnando o corpo e a roupa com um cheiro a urina. À noite a solidão exagera-se, no silêncio da casa vazia, meio fechada, com os móveis cobertos de lençóis brancos, a parecerem fantasmas. Mas não são estes que a assustam mais, são os outros, as suas recordações, a idade a assombrá-la nas horas que leva até lograr dormir, naquela tremideira constante, a presença permanente da noção de que a morte pode aparecer a qualquer momento a levá-la, tem medo, não sabe o que a agarra à vida mas não quer morrer, disso tem a certeza. De terço na mão passa as infindáveis horas a rezar em frente a um cristo de marfim crucificado numa cruz negra de pau-santo com incrustações de madrepérola. O cristo de marfim pintado sangra tinta das cinco chagas e não lhe responde, suspenso da cruz permanece de olhos fechados, talvez não a oiça. Só assim consegue esperar algum sono, os medos desvanecem-se ao desfiar a mesma ladainha vezes sem conta até lhe pesarem as pálpebras e tomar o sentido da cama, dos lençóis, dos cobertores e do travesseiro e não pensar, nem sonhar, até o sol lhe entrar pelo quarto manhã cedo.


s.m. Agradeço, em nome do Cultura, a sua enorme disponibilidade, a sua simpatia, a humildade e o elevado interesse pelo trabalho que este blogue tenta fazer a nível da divulgação artística e desejo-lhe muito sucesso e inspiração.