sandra martins - Olá Inês. Em primeiro lugar quero dar-lhe os parabéns pelo blogue e pela publicação do seu livro “QuartoEscuro”. É um prazer imenso poder contar consigo aqui neste nosso cantinho. Esperamos que com estas questões os nossos leitores a possam vir a conhecer melhor e, quem sabe, para quem ainda não a leu, despertar o interesse para o seu trabalho literário.
s.m. Quando começou a escrever?
Escrevi num diário durante muitos anos…experimentei o jornal da escola que frequentei no 7º ano, ia escrevendo coisas para os amigos…sempre foi mais fácil para mim usar cartas, texto, para dizer às pessoas que gostava delas…essa era a minha primeira grande necessidade na escrita.
O blogue foi a forma que encontrei de escrever. Ele começou a crescer a sério há dois anos, quando voltei de Moçambique. E fez sentido que crescesse porque houve evolução. A Internet é, e continuará a ser, uma poderosa ferramenta de divulgação: dá visibilidade a autores jovens e aumenta a procura e o interesse.
O blogue foi muito anterior ao livro. Sinceramente quando o Bocados foi criado, não havia a ideia do livro.
s.m. Como se sente perante as críticas dos seus leitores e críticos?
É muito fácil recebermos críticas quando não há nada em jogo. Tive muita sorte, tive o apoio e o incentivo de professores e colegas na faculdade, tive a sorte de lançar o livro no Correntes d´Escrita 2007. Existiram reacções profundamente particulares, estranhas até, de leitores que se aproximaram de mim pelo livro…porque de alguma forma o livro mexeu com eles.
s.m. Qual foi a sensação de ver o seu primeiro livro publicado? Trouxe mudanças na sua vida?
Eu tenho um livro publicado. Através do livro ganhei amigos-leitores. Essa foi a grande mudança.
s.m. Conte-nos que tal é a experiência dentro da barriga do monstro livreiro do nosso país.
Profundamente angustiante (lol)
s.m. Como surgiu o título do seu livro “QuartoEscuro”?
Foi difícil pensar num título para este livro. O Luís Cristóvão, o meu editor, ajudou-me a pensar. Decidimos “Quarto Escuro” porque fazia sentido. O livro em si, é de facto, um quarto muito escuro.
É um livro particular, que fala de afectos, que faz pensar e que faz sentir. Um leitor disse-me que o fazia sentir frágil. Eu fiquei a pensar nisso muito tempo… Fazer alguém sentir, é uma coisa muito séria.
Quando falamos do “Quarto escuro”, estamos a falar de um livro pequeno, de leitura asfixiante, composto por micro narrativas.
s.m. Inês, considera mais complexo - escrever poesia ou prosa?
Eu sinto que o meu caminho é a prosa. Acho que ambos são caminhos muito pouco fáceis.
s.m. Teve formação académica em Escrita Criativa? O que pensa desta disciplina?
Não, não tive. Mas considero que seria interessante fazer um curso desse género…é bom conhecer e partilhar. E esses cursos têm habitualmente espaço para o conhecimento e para a partilha.
s.m. Em termos literários, acredita no termo "Inspiração", no termo "Transpiração" ou na sua simbiose?
Acredito profundamente na inspiração. Há coisas que se passam à minha volta que me fazem escrever. Sem elas, o bloqueio era profundo e não saberia dizer nada de novo.
E já sei distinguir perfeitamente um momento de inspiração: sei o que tenho a fazer quando o sinto.
Sinceramente não tenho tempo para escrever. O bocadosdecarne ajuda-me a sentir que tenho de arranjar tempo, dê por onde der.
Como lhe disse. Nasce sempre por inspiração. E a minha inspiração surge das coisas mais estranhas que possa enfrentar ou reconhecer na rua, em casa, com as pessoas que me rodeiam. Vem sempre de algo ou de alguém. E depois a história toma rumo próprio na minha cabeça, as personagens crescem e o enredo nasce.
Eu já conhecia o Luís Cristóvão da faculdade, ele era, e penso que ainda é, um leitor do blogue. Um dia ele disse-me que queria editar-me e eu gostei da ideia. (lol). Convidou-me a reunir alguns textos e a apresentar-lhos. Foi o que fiz, e em Fevereiro de 2007 o livro nasceu.
Eu penso, e continuarei a pensar, que é fundamental o nome de uma editora.
Poucos autores marginais publicados…devíamos ser mais. Deveríamos ser uma aposta constante.
Penso que será mais sensível ao Romance…mas também vejo muita gente que precisa de poesia para respirar.
Sim. Concorri a um concurso de peças de teatro. E com muita pena não ganhei (lol)
Tenho 3 peças por editar: “Quem tramou António Lobo Antunes”, “A última história de Werther” e “Amor em estado Morto”. Trata-se de uma trilogia.
António Lobo Antunes, Gonçalo M. Tavares, Henry Miller (um escritor que me é muito querido).
Sinto que me estou a apaixonar muito devagarinho por Lídia Jorge e por Ruben A.
Muitos. Acho que o livro que mais me marcou foi o “Retrato de Dorian Gray” de Oscar Wilde; Milan Kundera “A insustentável leveza do ser” é também uma referência.
Sou viciada em Lobo Antunes desde os 19.
Eu acho que existem tantos…é injusto dar só um nome….
Mas Paula Rêgo, talvez. Escolho-a porque ela é o grande rosto da pintura portuguesa no estrangeiro, e é uma autora que transforma o grotesco, como eu nunca imaginei ser possível. Acho que ver uma pintura de Paula Rêgo, é ver cultura Portuguesa moderna no seu melhor.
Acho que o sistema esquece a educação para a cultura. Aprende-se a gostar e a aprende-se a compreender. No ensino pré-escolar e primário não existe qualquer preocupação em explicar arte e mostrar arte às crianças. Indivíduos que não são expostos a movimentações culturais em criança, não o serão certamente em adultos. E isso é uma falhar gravíssima no nosso sistema. Espero que mude.
A nossa grande arma é a educação.
Gostava de publicar um conto infantil. Escrevi um conto quando vim de Moçambique, sobre a experiência que tive numa missão com crianças e adultos infectados com Sida na casa das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus. Foram possivelmente os meses mais completos e mais felizes que vivi. As ilustrações do conto estão quase prontas.
Escrever muito, sempre, até se atingir um estilo único e uma forma própria.
É disso que se precisa.