quarta-feira, fevereiro 15, 2006
ECPHRASIS
Olhas-me de frente nos olhos com coragem mas sem agressão como quem convida a entrar em ti a passar a porta abrir a capa e conhecer-te
Como quem vê fundo em mim, como se eu que aqui estou este corpo esta carne esta rede de memórias e ideias fosse vento, cortina ao vento e não porta fechada para o nada para coisa pouca e tu fosses entrando e me lendo
O cabelo adivinha-se comprido pela mecha que se vê. nesses anos deviam olhar para ti na rua e saber, se calhar diziam-te alto como quem insulta com mesquinhez de quem pega numa coisa tão simples e a faz suja fabricando as palavras que ferem, que rasgam, mas que mostram como o seu mundo é pequeno e sujo. Mas o cabelo está comprido Al Berto está comprido e ele demora a crescer, pelos dias, e todos os dias decidiste não o cortar, não sei se por coragem por grandeza sei lá porquê mas não o cortaste como se fosse mais forte do que tudo o que te pudessem dizer
Tens o queixo angular, corajoso se há psicologia na fisionomia de um rosto se se pode ler uma cara
E nota-se a fita-cola da fotografia como se saísse de um passaporte lembrando-me de viagens e das que li tuas em que só o movimento faz sentido e nenhuma cidade te fosse aprisionar. não era isso que dizias? não era isso que escreveste neste mesmo livro? não falaste de desertos e de atravessá-los tantas vezes e de cidades? não era assim que começava “ sempre levei pouca coisa na bagagem” bagagem e viagem. e quem cá ficou? O sépia da foto é a cor dos mortos.
A noite que imagino nos teus livros, noite de cidade labirinto, noite de corpos que se encontram, como se só no escuro e às cegas nos pudéssemos tocar de verdade, matar essa sede de toque que a luz do dia queima.
Falam ainda de ti
Alberto Raposo Pidwell Tavares, o Al Berto foi (Al Berto) nació en Coimbra el 11 de enero de 1948. El año su familia se instala en Sines (Alentejo), donde pasa parte de la infancia y adolescencia.
Al Berto, um dos autores mais influentes da
Foi a partir desta viragem da sua vida que Al Berto decidiu abandonar
poesia de Al Berto é um grito da fragilidade extrema e irredutível do ser humano
em várias línguas em vários tons lêem-te na rua e n´O Medo, logo no início, fizeste um poema chamado atrium como quem convida a entrar e a seguir-te pela Casa. Pela Cidade. Pelo Corpo. Como Virgílio nos guiando pelo fio de ariadne das palavras. como um anjo mudo que nos sussurra em silêncio, como nos filmes de wim wenders. como um incêndio que ateias com o lume das palavras.
E vamos, vamos sempre. Como não te seguir se não mediste a vida por horários mas pelas fases da Lua. pela poesia, pelo sabor dos outros que parecia quereres sentir, devorar.
Como não te seguir?