quarta-feira, junho 13, 2007

Pedro Chagas Freitas














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Blogue Pessoal

Pequena Biografia

Pedro Chagas Freitas é licenciado em Linguística pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e tem já, entre outras obras de ficção, biografias e textos de especialidade em diversas áreas. Venceu vários prémios literários, entre eles a Bolsa Jovens Criadores 2006 e o Prémio Paul Harris 2000.
Como jornalista já trabalhou em "A Bola", "DN Jovem" e "Inside". Escreve guiões para cinema e banda desenhada e escreveu obras biográficas para os grupos Impala e Mediapromo. É revisor linguístico e consultor criativo para empresas e particulares. É, ainda, cronista de humor na publicação Rede 2020 e no site "Empreender" e de ficção no jornal "Notícias de Guimarães". Coordena, também, sessões de escrita criativa. Mas vamos conhecê-lo um pouco melhor...

Livros Editados

Mata-me da Corpos Editores
O Evangelho da Alucinação da Corpos Editores
Já Alguma Vez Usaste o Sexo sem Necessitares de Usar o Corpo da Corpos Editores
Os Dias na Noite da INDIEbooks


Entrevista

sandra martins - Olá Pedro. É um imenso prazer poder contar com as suas palavras aqui no nosso Blogue. Noto que é bastante dedicado ao mundo da divulgação artística e à interacção com os leitores e futuros escritores do nosso país, posso perguntar-lhe como é a relação com os seus leitores e críticos?

Pedro Chagas Freitas – Agradeço-lhe, antes de mais, o convite que me expressou; é uma honra estar aqui neste espaço extremamente interessante no campo da divulgação artística. Depois, e respondendo à sua questão, só poderei afirmar que, de facto, procuro ter uma relação o mais próxima possível com os meus leitores. Recebo-os de braços abertos e tento, compreendendo o quão importante isso pode ser em dados momentos, auxiliá-los da melhor forma que consigo.

Por outro lado, e como o feedback é, sempre, algo de muito importante sob o meu ponto de vista, constituí, ao longo do tempo, aquilo que costumo chamar de “Conselho de leitores”, que mais não é do que um grupo de pessoas, das mais diversas áreas - e que, em muitos casos, nem sequer conheço pessoalmente -, que tem a seu cargo a tarefa de ler as obras que vou produzindo, ainda em bruto, e, depois, oferecerem-me as suas indicações – genéricas e também mais específicas. Isso é, efectivamente, decisivo para mim.

Dentro desse “Conselho” pode encontrar-se críticos literários, escritores e pessoas da área; mas também pode encontrar-se pessoas que em nada estão ligadas, profissionalmente, à escrita ou à arte, mas que podem, por serem leitores dedicados, ser de uma utilidade enorme para mim e para determinados pormenores – técnicos, temáticos e estilísticos.


s.m. Qual é/ foi o seu percurso académico? O que lhe ocupa a maior parte do tempo?

P.F. Depois de terminar o ensino secundário, estudei, em Lisboa, durante quatro anos, Linguística. Foi um curso extremamente útil, ensinando-me bastante sobre o funcionamento da língua e oferecendo-me, assim, uma base de sustentação sólida para o que haveria de ser – e então já o era, também – o meu trabalho.


s.m. Quando começou a escrever?

P.F. A língua portuguesa é – e sempre foi – o meu instrumento de trabalho, e, ao mesmo tempo, a minha paixão. Escrevo, profissionalmente, desde os dezassete anos, quando me iniciei – e logo como chefe de redacção. Desde então, nunca mais parei de estar ligado à produção escrita. Mas já antes dessa idade escrevinhava umas coisas – coisas de adolescente, que, orgulhoso, mostrava à família que, como é natural, dizia que eu iria ser o próximo Fernando Pessoa.

Na verdade, tenho a firme consciência de que só o treino fez com que pudesse estar a um nível que considero aceitável. E, para isso, foi fundamental, mesmo, o meu percurso profissional, que fez com que escrevesse desde livros sobre automóveis até biografias, passando por crónicas desportivas e de humor, não esquecendo os textos publicitários, o guionismo, etc. Enfim, todas estas formas de escrita, apesar de aparentemente desconexas entre si, foram – e são – pilares de trabalho que me forneceram pistas e moldes utilíssimos para conseguir produzir aquela que, para mim, é a arte derradeira, a arte que tudo pode aglutinar dentro de si: o romance.


s.m. Além dos livros Mata-me e o Evangelho da Alucinação sei que já publicou outros e/ ou publica, actualmente, noutros suportes. Poderá revelar aos nossos leitores quais?

P.F. Já publiquei, para além dos dois títulos que refere, mais duas obras – “Já Alguma Vez Usaste o Sexo sem Necessitares de Usar o Corpo” e, mais recentemente, “Os Dias na Noite”. Para além disso, escrevo, como referi na resposta anterior, em variados suportes. Na vertente literária propriamente dita, escrevo para publicações regionais e nacionais pequenas crónicas de ficção – que muitas das vezes se revestem de um cariz filosófico –, ao mesmo tempo em que colaboro, também, com a revista de micronarrativas “Minguante” e com algumas revistas e sites na área dos textos de humor – uma área que também me tem vindo a fascinar bastante.

Continuo, ainda, a dedicar-me ao guionismo – está para breve a estreia de uma curta-metragem – e à escrita jornalística e publicitária (o copywriting, que, confesso, me dá um prazer enorme).

A internet, por seu turno, está também bem presente na minha produção. Para além de alimentar os meus sites pessoais, vou colaborando com alguns outros – não sei dizer não a um convite e as coisas têm-se acumulando – e até tenho um site, bem conhecido na rede, em que assino sob pseudónimo. E tem sido extremamente profícuo escrever sem que saibam quem sou – sem que haja uma espécie de pré-leitura (derivada do conhecimento do autor). O feedback, assim, é mais puro – mais imaculado.


s.m. Actualmente a Internet é uma importante ferramenta na divulgação de todo o tipo de arte e o Pedro tem vários sítios online, um pessoal onde os seus leitores podem acompanhar a sua evolução e reconhecimento público e outros de divulgação de projectos e de inéditos. O que pensa deste mundo? A criação destes suportes foi posterior ou anterior à publicação dos seus livros?

P.F. É um mundo fascinante mas que pode, como todos os mundos – como o mundo em sentido lato –, ter, dentro de si, potencialidades eventualmente perversas. O importante é saber usá-lo e não deixar que seja ele a usar-nos. É isso que procuro fazer: colocá-lo ao meu dispor e não deixar que seja ele a ter-me ali, sempre, às suas ordens.

Os suportes que refere são, todos, posteriores ao lançamento da primeira obra de ficção, e surgiram, em primeira análise, como resposta a esse desejo – meu e dos leitores – de criação de uma ponte entre quem escreve e quem lê. E penso que foi uma decisão acertada. A prova disso é que todos os locais – entretanto fui criando mais – estão vivos, são visitados e, mais importante do que isso, bem visitados.

s.m. Os seus livros são Ficção, o primeiro recebeu uma recensão bastante positiva por parte do “Expresso” e o segundo é considerado uma revolução literária. Como se sente perante este sucesso? Como foi a transição?

P.F. Terei de acrescentar, a essa questão, a recepção aos dois últimos que, sobretudo em relação a “Os Dias na Noite”, tem sido ainda melhor. Tive o prazer de ler, em jornais nacionais, pessoas que muito respeito a defenderem que eu poderia ser um dos grandes escritores deste país e que era, desde já, um grande escritor. É evidente que isso me envaidece bastante e que funciona, sobretudo, como um factor de motivação para não parar – não que eu, caso isto não acontecesse, fosse parar –, para seguir o meu percurso.

No que diz respeito à transição entre livros, não se poderá, sequer, falar nela. As obras que vou publicando estão, regra-geral, colocadas em pousio; isto é: já foram escritas há algum tempo e esperam, apenas, a hora de saírem da sombra e encontrarem o sol das livrarias. Tenho tentado, desde que iniciei a publicação das minhas obras ficcionais, manter uma distância, entre livros, de cerca de meio ano. Mas, feliz ou infelizmente, o meu ritmo de produção é superior ao meu ritmo de publicação, o que faz com que as obras se acumulem aqui em casa.


s.m. Qual foi a sensação de ver o seu primeiro livro publicado? Trouxe mudanças?

P.F. Foi uma sensação de justiça. E quando falo em justiça não falo em mérito qualitativo – que é sempre, para todos, altamente subjectivo; falo, isso sim, em mérito quantitativo – se assim lhe poderemos chamar. Quando lancei o primeiro livro tinha já escrito milhares de páginas e alguns romances. Foram, todos, treinos para a mão. E, nesse sentido, ter finalmente algo publicado foi a justiça de compensar todo esse labor incessante.


s.m. Conte-nos que tal é a experiência de ser um autor reconhecido no mercado livreiro do nosso país.

P.F. Não sou, de todo, um autor reconhecido no mercado livreiro. Isso é que irónico naquilo que apelida de mercado livreiro: os leitores conhecem-me mas o mercado não. Ou então sou eu que não conheço o mercado e estou a confundi-lo com outra coisa qualquer. Mas a opinião que tenho dele – do mercado – é a de que não é boa pessoa. Ou então, se calhar, é a de que ele nem sequer é uma pessoa.

s.m. Como surgiram os títulos Mata-me e Evangelho da Alucinação?

P.F. Os títulos são, para mim, uma das áreas mais fascinante de criação – ou não fosse eu, também, copywriter. Nos casos que refere, a escolha foi diferente: enquanto que em “Mata-me” se tratou, somente, de escolher uma das palavras que mais era repetida ao longo da obra; no caso de “O Evangelho” foi mais o encontrar de uma definição, genérica, do que na obra se poderia encontrar.


s.m. Fale-nos um pouco de cada uma das suas obras.

P.F. “Mata-me” é uma novela curta, dolorosa, cruel até. Viaja entre dois planos narrativos – e temporais – e está escrita numa prosa rendilhada, trabalhada, no limiar da prosa poética.

“O Evangelho da Alucinação” é um microdicionário, um género nunca visto até então. Está dividido por entradas lexicais, como um dicionário, e vai avançando de forma alfabética. Termina, depois, com um pequeno conto de ligação com o dicionário. É uma obra na fronteira do filosófico.

“Já Alguma Vez Usaste o Sexo sem Necessitares de Usar o Corpo” é uma junção de duas artes: o desenho, com trabalhos do Rui Laranjeiro (um artista de grande talento) e textos da minha autoria. É, este sim, um livro de aforismos filosóficos completamente assumidos enquanto tal.

“Os Dias na Noite” é um romance, escrito em três planos narrativos, muito movimentado – está sempre qualquer coisa a acontecer – mas que pode, também, ser alvo de uma leitura mais profunda. Costumo dizer que pode ser uma droga leve ou uma droga dura – dependendo do leitor que o encarar.


s.m. Dada a sua experiência como escritor, jornalista, linguista e coordenador da “Fábrica de Escrita” posso perguntar o que considera mais complexo - escrever poesia ou prosa?

P.F. São provas diferentes. Uma – a prosa – é uma prova de fundo, uma maratona. Exige capacidade de resistência e uma força de vontade inabalável. A outra – a poesia – é uma prova de velocidade, em que tudo se resolve em menos tempo e em que o estado de espírito do momento pode, apesar de a entrega e força de vontade serem também decisivas, fazer a diferença.

Pessoalmente não tenho preferências: escrevo. E é tudo.


s.m. Teve formação académica em Escrita Criativa? O que pensa desta disciplina?

P.F. Frequentei, no meu tempo universitário, diversos ateliers de Escrita Criativa. O que posso revelar é que me foram extremamente úteis e me permitiram escrever ainda mais. Penso que é isso que se deve esperar deles: que nos obriguem, ou motivem, ainda a escrever mais e mais, – obviamente com a aprendizagem, aqui e ali, de algumas noções ou dicas interessantes.

O importante, neste ponto, é fazer as pessoas entenderem que os ateliers de Escrita Criativa não vão ensinar ninguém a escrever; vão ser, isso sim, mais uma fonte de treino. Apenas isso. E, nesse sentido, são extremamente úteis – para principiantes e, também, pela partilha de conhecimentos entre os participantes, para consagrados.


s.m. Sei que iniciou um programa de Criação Literária denominado “Fábrica de Escrita” – poderá explicar aos nossos leitores do que se trata?

P.F. A “Fábrica de Escrita” é um projecto – já com mais de um ano de existência – em que se procura trabalhar sobre todas as áreas da escrita. Temos escolas de escritores – uma de jovens e outra de adultos – e vamos, um pouco por todo o país, realizando ateliers de escrita. Já estivemos em Aveiro, Porto, Amarante, Guimarães, etc. Vamos estar, ainda este ano, também nos Açores.

Já orientei mais de mil horas de sessões de escrita criativa e é algo que me dá um grande gozo. É fantástico observar a evolução que, com o correr do tempo, os operários da escrita, como lhes chamo, vão sofrendo. É mágico.

Mas a “Fábrica de Escrita” não trabalha, apenas, na organização de ateliers de escrita. Produzimos, também, textos para os mais diversos formatos: publicidade, guionismo, jornalismo, etc.

É, no fundo, aquilo que a sua denominação indica: uma fábrica de escrita.


s.m. Neste seu projecto podemos encontrar alunos das mais variadas idades. Como é trabalhar com um público tão diversificado? Qual é o feedback?

P.F. Como referia na resposta anterior, é mágico ver a evolução, em todos os operários – ou quase – de dia para dia. Recebemos pessoas das mais diversas áreas de formação e das mais diversas idades e é fascinante perceber o crescimento que vão tendo de sessão para sessão. É um trabalho altamente enriquecedor.


s.m. Em termos literários, acredita no termo "Inspiração", no termo "Transpiração" ou na sua simbiose?

P.F. A inspiração existe, de facto; é o momento que antecede a expiração. É só nessa inspiração que acredito. A outra é um mito.

Tudo é trabalho: e eu poderei ser a prova provada disso mesmo. Quando visito os meus escritos do tempo em que acreditava na inspiração e me deixava estar, quieto e introspectivo, à espera das ideias – à espera da inspiração -, chego a envergonhar-me daquilo que leio. Se tivesse continuado com essa perspectiva – romântica e irreal –, hoje não seria capaz de escrever nada que pudesse ser, no mínimo, fraco. Era péssimo. Mas – e essa é uma prova inexorável daquilo que afirmo –, mesmo sendo péssimo, consegui atingir um nível que considero, já, publicável. Logo: não acredito no dom; ou melhor: acredito no dom de ter força para trabalhar. Costumo dizer que só quando dói é que a literatura está a ser, realmente, boa.


s.m. Sente necessidade de organizar o seu tempo para escrever?

P.F. A minha vida é escrever. Assim sendo, toda a minha agenda é organizada em função da escrita. O que faço é segmentar os tipos de escrita: humor, ficção, biografias, etc.


s.m. Como caracteriza o seu processo de escrita?

P.F. Intensivo. Obsessivo. Escrevo, em média, oito horas por dia.


s.m. Os seus livros foram todos editados pela Corpos Editores? Como foi o processo?

P.F. O último foi editado pela INDIEbooks. No caso da Corpos foi um processo simples: enviei os textos, gostaram e avançámos.


s.m. O que pensa das edições de autor?

P.F. Acredito que as edições de autor são um refúgio que pode, e deve, ser melhorado e melhor acolhido no mercado. Há grandes obras publicadas em edição de autor. E haverá, tenho a certeza, muitas por publicar.


s.m. Qual é a sua opinião em relação ao mundo editorial?

P.F. Maquiavélico. Canibal. Come, sem misericórdia, quem não tiver uma carapaça de aço.


s.m. Acha que o público, em geral, é mais sensível à poesia ou ao romance? E qual será a razão?

P.F. O romance é inequivocamente mais vendável. Tem movimento, tem acção, tem enredo – tem, no fundo, a vida mais vida; mais palpável. Entendo perfeitamente que assim seja.


s.m. Que autores lê frequentemente? E que autores aconselha aos seus alunos da “Fábrica de Escrita”?

P.F. Sou adepto das drogas pesadas. Mas costumo dizer que mais vale consumir das leves que nenhuma. Em relação a nomes, gosto de fragmentos, apenas, de muitos autores: Camus, Lobo Antunes, Fiódor Dostoiévski, Marguerite Duras, Gonçalo M. Tavares, Haruki Murakami, entre muitos outros. E são esses mesmo que procuro recomendar aos operários da fábrica.


s.m. Qual foi, até hoje, o(s) livro(s) e/ ou autor(es) que mais o marcaram? Porquê?

P.F. Não houve um autor ou um livro, em específico, que me tivessem marcado. Sou um leitor analítico e, nesse sentido, delicio-me com pedaços, com fragmentos de obras. Fragmentos de verdadeira magia – etéreos mesmo. E encontrei momentos desses em obras de todos os autores que referi na questão anterior.


s.m. O que nos reserva para um futuro próximo, em termos de criação literária?

P.F. Está em agenda o lançamento de mais uma obra de ficção até ao final do ano. Estou, ainda, em processo de selecção de entre as muitas que tenho em pousio.

Por outro lado, estará, em muito breve, no mercado uma colecção de biografias de grandes nomes da história mundial, que também foi – e ainda está a ser – redigida por mim.

Vai ser filmada, também em breve, uma curta-metragem da minha autoria.

Há, ainda, outros projectos; mas estão em fase embrionária e seria demasiado precoce expô-los neste momento.


s.m. Pedro, que conselho daria a quem sonha melhorar o seu processo de escrita e, por fim, publicar as suas palavras?

P.F. Nunca parar; nunca ceder à tentação de um programa de televisão ali ao lado quando se tem tempo – e vontade – para escrever. Alguém, um dia, terá dito que é necessário, para se ser, mesmo, escritor, optar entre viver e escrever o viver. É essa a opção que têm de tomar. Eu já tomei a minha.

Em nome do Cultura agradeço a disponibilidade, a extrema simpatia e vejo-me forçada a referir, neste espaço, a elevada modéstia que encontrei no seu carácter. Por tudo isto parabéns e muito sucesso. Estaremos aqui para o ler.