segunda-feira, maio 14, 2007

Fernando Esteves Pinto
















Fernando Esteves Pinto nasceu em Cascais em 1961. Colaborou no DN Jovem e no Jornal de Letras. Em 1990 recebeu o Prémio Inasset Revelação de Poesia do Centro Nacional de Cultura. É publicado em Portugal e Espanha por revistas literárias e editores independentes. Em 1998 obteve uma bolsa de criação literária pelo Ministério da Cultura/Instituto Português do Livro e das Bibliotecas. Está representado na Antologia DN Jovem, 1990; Antologia "A cidade e o Mar na Poesia do Algarve", 2006; Antologia "Poema Poema" de poesia portuguesa actual. Edição bilingue. Punta Umbria, 2006.

Livros publicados:
- Na Escrita e no Rosto (poesia) Editora Europress
- Siete Planos Coreográficos (poesia, edição bilingue) Editora 1900, Huelva
- Ensaio Entre Portas (poesia) Editora Almargem
- Conversas Terminais (romance) Editora Campo das Letras
- Sexo Entre Mentiras (romance) Editora Leiturascom.Net


Breve Entrevista

1. Olá Fernando. Obrigado pela disponibilidade, desde já. Posso perguntar-te qual é a tua formação e experiência profissional? Que idade tens? Quantos livros já editaste até hoje?
R – Assumo-me como autodidacta. Não tenho formação académica nem profissional. E isso dá-me um certo gozo. Mas estudei até ao 9º ano. Desisti porque não consegui ultrapassar a barreira da matemática. Tenho uma grande paixão pela psicologia. Interessa-me tudo sobre essa matéria. Costumo dizer que sou formado em seres humanos. Desde criança que os observo de forma estranha. Quanto a empregos, acho que sempre fui mal-empregado. Tenho 46 anos e publiquei 5 livros.

2. Tens mais projectos na gaveta à espera de serem libertados para o mundo editorial? Prosa ou Poesia?
R – Tenho um romance inédito que já passou por quase todas as editoras portuguesas (uma das quais – Temas & Debates – rejeitou-o por excesso de qualidade, segundo as palavras da editora). Tenho de falar sempre disto. Um romance culto e sofisticado que não seria entendido pelo leitor comum de romances em Portugal, etc. etc… (ainda palavras da senhora). Tenho também inéditos um livro de poemas, um ensaio, uma novela e uma peça de teatro. Neste momento estou a trabalhar num livro de poemas.

3. O que consideras mais complicado? Escrever poesia ou prosa? Porquê?
R – Comecei pela poesia. Pensei que seria uma forma mais fácil de entrar no meio literário. E assim aconteceu. Mas estou muito à vontade nos dois géneros. Escrevo poesia como forma de intensificar a minha mente. O romance dá-me mais liberdade, apesar de me obrigar a uma disciplina diária.

4. Qual a sensação de ver um livro com o teu nome, publicado?
R – já experimentei várias sensações. O primeiro livro “ na escrita e no rosto” joguei-o ao chão e pisei-o. É um livro amaldiçoado. Quando li na capa o pseudónimo que utilizei no prémio revelação de poesia Inasset/Inapa, senti que me haviam roubado a identidade. É um livro que não me deu nada, só me tirou. Para complicar mais as coisas, esse livro foi alvo de plágio. Faz parte dum processo ainda na justiça.

5. Em termos literários, acreditas na inspiração?
R – Nunca. Para mim a escrita é uma obrigação. Eu provoco a escrita, faço-a acontecer. Sempre foi assim. É claro que posso estar mais ou menos preparado para atingir os meus objectivos.

6. O que pensas das edições de autor? Achas que estamos numa era em que qualquer um pode editar?
R – Tenho um princípio: sou incapaz de editar um livro meu com despesas por minha conta. Isso é uma forma de imposição, narcisismo face aos outros – os leitores. É estar a vender algo. Não sou vendedor. Cabe aos editores essa tarefa. Havendo dinheiro e vaidade, qualquer um poderá editar o que quer. Desconfio sempre desses autores.

7. Quanto tempo dedicas à escrita ou é um processo totalmente livre?
R – Estou sempre a escrever, embora não o faça fisicamente. Mas ocupo as manhãs a escrever e o resto do dia a pensar em escrever.

8. Como caracterizarias o teu processo de escrita?
R – Vou sempre zangado para a escrita. Penso que a escrita tem medo de mim. É como se fosse para um campo de batalha e lutasse permanentemente para não ser vencido. Às vezes vou mesmo desprotegido, mas acabo por utilizar as armas que o inimigo (a própria escrita) tem apontadas contra mim.

9. Já ganhaste alguns prémios literários, verdade? Quais?
R – O prémio revelação Inasset/Inapa – Centro Nacional de Cultura. E obtive uma bolsa de criação literária pelo Ministério da Cultura/Instituto Português do Livro e das Bibliotecas, com a qual escrevi o romance “Conversas terminais”.

10. Interessam-te os temas mais angustiantes do ser humano e escreves todos os podres, as sombras e as luzes do ser humano de uma forma crua e bruta. Como é desencadeada a tua urgência em escrever?
R – A minha matéria de escrita são os outros. Abordo-os sempre pelo lado negativo. Desde criança que me interesso pelo pior das pessoas. Isso tem uma justificação. Quando tinha 9 anos, os meus pais foram esfaqueados na própria casa onde vivíamos. Assisti a tudo. Enfrentei o agressor. Escrevi muito sobre isso. Tento compreender esse lado escuro das pessoas.

11. Quando começaste a escrever? Alguma razão em particular?
R – Comecei a escrever porque é a arte mais barata que existe. Parece cómico, mas é a verdade. Eu tinha a paixão pela pintura. Queria ser pintor. Estive mesmo para frequentar a escola António Arroio. Não fui por causa dum selo fiscal. Senti os meus sonhos serem traídos por um selo fiscal, imagina. Um maldito selo fiscal que representava na altura um terço do ordenado do meu pai, e que ele teria de comprar como penalização pelo facto de a minha inscrição decorrer fora dos prazos estabelecidos pela escola. Nas contas do meu pai, um simples jardineiro da Câmara Municipal de Cascais, a somar ao selo vinham as despesas do transporte e da alimentação, livros, material de pintura; uma lista avassaladora cujo valor final ultrapassava escandalosamente o orçamento familiar.

12. Qual é o teu livro preferido (dos que já escreveste)?
R – “Conversas Terminais”. Está lá dentro a vida toda. Toda a infância. Toda a merda dos outros. Ficção e realidade: tudo misturado. Se me perguntam se isto é verdade, eu digo que é ficção. Se me perguntam se isto é ficção, eu digo que é verdade. Adoro isto.

13. Que autores lês?
R – Philip Roth. John Updike. Milan Kundera. Vergílio Ferreira. António Lobo Antunes.

14. Qual é o teu conselho para os jovens escritores?
R – Sejam verdadeiros a escrever. Se escreverem apenas para desabafar, então aconselho a fazerem amigos. Dá mais resultado e não atormenta.

Agradeço imenso a tua simpatia, rapidez e sinceridade. Em nome do Cultura desejo que os teus projectos futuros se concretizem da melhor forma.