Hoje o Cultura apresenta o escritor e pianista Fernando M. Dinis que nos deu o prazer de responder a algumas questões para que o possamos conhecer melhor.
Breve Biografia:
Breve Entrevista:
s.m. Olá Fernando. Em primeiro lugar quero agradecer a sua disponibilidade e simpatia para com o Cultura. Que idade tem? Qual é a sua formação e experiência profissional?
s.m. Sei que publicou o livro Dá-me-te e tem alguns textos num outro com o título Poema Poema. Pode falar-nos acerca deles? (Trata-se de poesia, prosa ou ambos?)
F.m.D. – O Dá-me-te é um livro ambíguo, pois é uma colagem de poemas e textos de prosa-poética que fui escrevendo ao longo de variados anos. Quando surgiu a possibilidade de editar, o que aconteceu através da Hugin, limitei-me a reunir os trabalhos que eu julgava mais marcantes que tinha escrito até então. Hoje, talvez fizesse as coisas de uma forma diferente. No Poema Poema, sendo uma antologia, constam apenas cinco poemas novos.
s.m. O título do seu livro é bastante apelativo. Como surgiu?
F.m.D. – Surgiu quando eu tinha 17 anos e compus uma música com esse título para a minha banda de rock. Nunca me passaria pela cabeça que 10 anos mais tarde, editaria um livro com esse nome. É uma palavra que sintetiza muito a atmosfera das paixões fulminantes, e que serviu de fio condutor na reunião dos textos que fiz para o livro. Achei que seria a palavra indicada, até pela sonoridade estranha.
s.m. Uma vez que já escreveu poesia e prosa poderá dizer-me qual dos géneros considera mais complicado?
F.m.D. – Escrevo tanto poesia como prosa. Apenas editei em poesia, mas já passei por vários romances, todos eles que me serviram de método de aprendizagem. Em relação ao processo criativo, a poesia é um trabalho de provocação. Estamos sempre à procura de novas formas/fórmulas de dizer as coisas. É um processo complicado, que nem sempre resiste aos tempos. Sou incapaz de me rever em alguns poemas antigos, exemplificando. Mas a sua magia preside aí mesmo. A poesia é algo que cresce connosco. A prosa, mais propriamente o romance, é ainda mais difícil, pois há que viver a história todos os dias, e trabalhar todos os dias. Se passamos uma semana sem tocar no que escrevemos, perde-se a nossa interioridade na história. A questão é que, nem sempre, temos períodos da nossa vida que permitam essa entrega permanente. De qualquer modo, escrevo todos os dias. Nunca mais de 3 páginas. Mais do que isso é baralhar ideias. No dia seguinte, arrefecido, emendo o que escrevi e sigo em frente.
s.m.Será possível levantar um pouco o véu dos seus projectos futuros para os nossos leitores?
F.m.D. – Felizmente encontro-me com novos projectos, tendo a edição apalavrada com uma editora para um novo livro de poesia, a sair em breve. Trabalho afincadamente num romance.
s.m. Os seus livros foram editados em que condições?
F.m.D. – O Dá-me-te foi pela editora Hugin, e teve uma distribuição magnífica. O Poema Poema, é uma antologia, editada em Espanha, pelo Uberto Stabile, que muito me honrou fazer parte...
s.m. O que sentiu com a publicação do seu primeiro livro?
F.m.D. – É algo de grandioso, a princípio. E lá damos por nós a entrar nas livrarias para sondar a distribuição, e a sentirmo-nos bem quando encontramos o nosso livro. Mas não muda nada na nossa vida. É algo que se esquece rápido.
s.m. Teve algum tipo de formação em Escrita Criativa?
F.m.D.- Nada.
s.m. Em termos literários, acredita no termo "inspiração"?
F.m.D. – Acredito no trabalho e na maturidade que se alcança ao longo dos tempos.
s.m. O que pensa das edições de autor?
F.m.D. Há muitos anos, fiz a edição própria de dois livros, experiência que não quero voltar a repetir. Não somos vendedores, já o disse o Fernando Esteves Pinto e muito bem.
s.m. Qual é a sua opinião em relação ao mundo editorial?
F.m.D. – Eu acho formidável que pequenas editoras consigam editar novos autores, embora existam detalhes nessas edições que escapam às massas. Falo de editoras que não se importam de editar autores novos, desde que estes, patrocinem a edição. Isto para mim é fazer uma edição de autor mas com distribuição assegurada. Outras editoras não. Assumem o risco. Mas acho que há lugar para tudo e para todos. De qualquer forma, sabemos que raros são os livros que são realmente lidos.
s.m. Acha que existem mais leitores de poesia ou romance? E qual será o motivo?
F.m.D. – As edições de poesia rondam os 300 exemplares, e por aqui se pode adivinhar a quantidade de leitores de poesia. O romance é mais cativante ao leitor, pode agarrá-lo através de uma história. É mais abrangente. É compreensível que assim seja. Eu próprio compro poucos livros de poesia. Romances, leio um quase todas as semanas.
s.m. Organiza o seu tempo para escrever?
F.m.D. – Depende. Normalmente os poemas acontecem. Frases que me surgem e me acompanham mentalmente dias a fio, até que resolvo escrevê-las e depois arranco para o resto do poema. Na prosa é diferente. Escrevo todas as manhãs as costumeiras três páginas. Gosto muito de escrever de manhã. Caso não escreva, ando rezingão o dia inteiro.
s.m Como caracteriza o seu processo de escrita?
F.m.D.- Inconstante. Tenho fases de trabalho muito intenso, e outras de puro abandono. Mas porque também gosto de compor, e passo algum tempo ao piano. Não há tempo para tudo.
s.m. Alguma vez se aventurou no mundo dos Prémios Literários?
F.m.D. – Nunca.
s.m. Quando começou a escrever?
F.m.D – Aos 9 anos, quando o meu pai comprou uma máquina de escrever lá para casa. A primeira tentativa foi uma peça de teatro (porque também já fui actor). Depois vieram os pequenos textos diários e só depois a poesia. A pretensão de escrever um romance foi só mais tarde.
s.m. Que autores lê frequentemente?
F.m.D. – Ando viciado no Haruki Murakami. E a minha prosa tem sido muito influenciada por ele. De resto gosto de Milan Kundera, Hermann Hesse, Kafka, Dostoievski. Dos portugueses gosto de José Saramago, Al Berto, Herberto Hélder…
s.m. Qual é o seu livro e autor preferidos? Porquê?
F.m.D. – Há muitos livros e autores. Posso dizer que um livro que me marcou imenso foi o Siddhartha de Herman Hesse. É um livro único e perfeito.
s.m. Que conselho daria a quem sonha retirar da gaveta as suas palavras?
F.m.D. – Escrever muito. Acreditar sempre.
s.m. Escolha um poema, de um dos seus livros, para acompanhar a sua entrevista.
Poema do EngateAtinge as palavras com fúria.
Avança na direcção
da rouquidão da noite.
Sabes que é assim
que se colhem paixões;
Com o cutelo do sonho empunhado,
os olhos esganados de desejo e o corpo a tremer,
numa ressaca de ternura.
in 'Dá-me-te', 2003, Hugin.